quarta-feira, 17 de abril de 2013

Despertando o verdadeiro coração da bravura.


Parte 1: O Caminho do Guerreiro
Se tornar um guerreiro e encarar a si mesmo é uma questão de honestidade mais do que auto-condenação. Olhando a si mesmo, você pode descobrir que tem sido um bom menino ou uma boa menina, e pode se sentir péssimo a respeito de si mesmo. Sua existência pode parecer penosa, completamente apagada, como o Buraco Negro de Calcutá. Ou talvez você veja algo bom sobre si mesmo. A idéia é simplesmente encarar os fatos. A honestidade tem um papel muito importante. Apenas veja a verdade simples e direta sobre você mesmo. Quando você começa a ser honesto consigo mesmo, você desenvolve uma genuína intuição sobre a verdade. Isso não significa necessariamente se diminuir. Descubra simplesmente o que está lá, simplemente veja, e então pare! Então, primeiro, olha para si mesmo, mas não se condene. É importante estar focado nos fatos, presente. Apenas olhe, e quando você ver a situação na sua plenitude, então você começa a ser o guerreiro.
Capítulo 1: Encarando a Si Mesmo
Nosso assunto é o guerreiro. Qualquer um que esteja interessado em ouvir a verdade, que no Budismo chamamos de dharma; qualquer um interessado em encontrar a si mesmo; e qualquer um interessado em praticar meditação é basicamente um guerreiro. Muitas abordagens em relação à espiritualidade e à vida em geral são influenciadas pela covardia. Se você tem medo de ver a si mesmo, pode usar a espiritualidade ou a religião como uma maneira de olhar a si mesmo sem ver nada de si mesmo. Quando as pessoas tem vergonha de si mesmas, não há destemor envolvido. Entretanto, se alguém tiver vontade de olhar a si mesmo, quiser explorar e praticar consciência aqui mesmo, então é um guerreiro.
“Guerreiro” aqui é uma tradução da palavra Tibetana “pawo”. Pa significa “bravo”, e wo a transforma em “a pessoa que é brava”. A tradição de guerreiros que estamos falando aqui é uma tradução de bravura. Você pode ter uma idéia sobre um guerreiro como alguém que incita a guerra. Mas nesse caso, não estamos falando de guerreiros como aqueles que vão pra guerra. A guerra aqui se refere à bravura e destemores fundamentais.
A bravura é baseada na superação da covardia e de nosso senso de ser machucados. Se nos sentimos fundamentalmente feridos, podemos ter medo que alguém possa colocar pontos em nós para curar as feridas. Ou talvez já tenhamos os pontos, mas não queremos que ninguém os tire de nós. A abordagem do guerreiro é encarar todas essas situações de medo e covardia. O objetivo geral da guerra é não ter medo. Mas o fundo da guerra é o próprio medo. Para ser destemido, primeiro temos que encontrar onde o medo está.
O medo é o nervosismo, o medo é a ansiedade, o medo é o senso de inadequação, um sentimento que não somos capazes de lidar com os desafios da vida diária. Sentimos que a vida é opressiva. As pessoas podem usar tranquilizantes ou yoga para suprimir seus medos: tentam flutuar sobre a vida. Elas podem fazer intervalos ocasionais para ir ao Starbucks ou ao shopping. Temos todos os tipos de truques e mecanismos que usamos para que podemos experimentar o destemor simplesmente tirando nossas mentes do nosso medo.
De onde vem o medo? Vem do nosso espanto ou desorientacão mais básico. De onde vem o espanto mais básico? Vem da incapacidade de harmonizar e sincronizar a mente e o corpo. Na pratica sentada da meditação, se você se posicional mal no assento, será incapaz de sincronizar corpo e mente. Você não tem uma percepção do seu lugar ou da sua postura. Isso se aplica ao resto da vida também. Quando você não se sente fundamentado ou adequadamente fixado no seu mundo, voc&e não pode se conectar com sua experiência ou à do resto do mundo.
Então o problema começa de uma maneira muito básica. Quando o corpo e a mente não estão sincronizados, você se sente como uma caricatura de si mesmo, quando como um idiota ou palhaço primordial. Nessa situação, é muito difícil se relacionar com o resto do mundo.
Essa é uma versão simplificada do que é conhecido como a mentalidade do sol-se-pondo: ter perdido completamente o caminho da harmonia de ser humano. A idéia do sol poente é que o sol já está se pondo no seu mundo, e você não pode ir além da escuridão. Você sente que só existe miséria, nuvens, a masmorra, vida na sarjeta. Para compensar por isso, você pode ir a um calabouço muito escuro com péssima luz, onde você se embebeda. Isso é chamado de um clube. Voc&e dança como um macaco bêbado que se esqueceu das bananas e de sua casa na floresta há muito tempo. Então se diverte com cerveja barata enquanto balança seu rabo. Não há nada com a dança per se, mas neste caso é uma forma de fugir ou de evitar o medo. É muito triste. É o sol se pondo. É um beco sem saída.
Em contrasto com isso, o Grande Sol do Leste é o sol que está plenamente nascendo em sua vida. É o sol da consciência, o sol da dignidade humana. É Grande porque representa a ascensão e as qualidades da abertura e da suavidade. Você tem um sentido austero da sua postura e lugar no seu mundo, que nós chamamos ter boa cabeça e pescoço. Está no Leste porque você tem um sorriso em seu rosto. O Leste é o conceito do nascente. Quando você olhar pra fora na primeira hora da manhã, você vê a luz vinda do Leste, mesmo antes que o sol apareça. Então o Leste é o sorriso que você tem quando acorda. O sol está para nascer. O ar fresco está chegando com o nascer. Por isso o sol está no Leste e é Grande.
Aqui, o sol é um sol completamente maduro, o sol que você vê no céu pelas 10 da manhã. É o oposto da imagem do macaco bêbando dançando à meia-noite na luz de lâmpadas elétricas. O contrasto é a visão estupenda e absolutamente extraordinária do Grande Sol do Leste que é austero e consciente, fresco e preciso.
Podemos ir mais a fundo nos detalhes mais tarde, mas primeiro deveríamos discutir a compreensão fundamental do medo e do destemor. Um dos principais obstáculos ao destemor são os padrões habituais que nos permitir nós nos frustarmos. Ordinariamente, não nos permitimos experimentar a nós mesmos plenamente. Digo, temos medo de nos encararmos. Experimentar o âmago mais interior de nossa existência é constrangedor para muitas pessoas. Várias pessoas tentam encontrar um caminho espiritual onde não tenham que encarar a si mesmas mas onde possa ainda assim libertarem – libertarem-se de si mesmas, na verdade. Na verdade, isso é impossível.

Part One: The Way of the Warrior
Por Chögyam Trungpa




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